te amo

cansei
de segurar “eu te amo”
fingir não amar
quando amo

cansei
das pessoas
dizendo
o que devo
não devo
quanto devo

cansei
de controlar
me controlar
em rebanho

tive planos
soube
supus que soube
o que vinha
era engano

me fizeram crer
que o amor era posse
corrente
furada
cilada

me fizeram crer
que não devo crer
vai acabar
tudo acaba
não existiu
nada existe

me fizeram crer
que o problema era eu
ou você
ou ele, que te segue
me persegue

me fizeram quer
que era errado
declarar, era se entregar
e se entregar, era feio
faz mal
pro ego

me fizeram crer
no redor
no que dizem
o que pensam, o que acham
e desviei
do foco:
seu olhar

me fizeram crer
no perigo
que sufoca, abala, provoca
faz pensar
e se pensar, veja só:
não dá jeito:
afasta

não sei quem fizeram
mas fizeram
e fazem

agora, já tarde, me retiro
em retiro
e percebo, como nunca

desaba, desabo
não tão rápido
não tão simples
aos poucos, às beiras
se foi, me fui

agora, sem planos
às claras
sou livre
vi, percebi, aqui
você

não se tranque
nem tente
direi, mesmo assim
que te amo
te amo
e te amo

blue

lembro daqueles olhos azuis
olhos tão azuis que cegaram
num brilho de mar
num brilho de terra
de cima

lembro daqueles cabelos lisos
que acompanhavam sorrisos
enquanto penteava-o
por obrigação,
com prazer

lembro daquele homem velho
que deu-lhe conselhos
talvez sérios
talvez ternos
nunca saberei

mas sempre volto à lembrança
daqueles olhos azuis
azuis que cegaram
num brilho de mar
num brilho de terra
jamais esquecerei

sinfonia de silêncios

o estrondo quando passa
o horizonte quando chega
o aperto quando sente
o tapa quando acaba
silenciosamente ensurdecedor

o gozo quando alcança
o adeus quando acena
o sorriso quando tenta
a morte quando finda
silenciosamente ensurdecedora

o desejo quando nasce
o pensar quando voa
a carícia quando toca
o olhar quando fixa
silenciosamente ensurdecedor

o estupro quando cessa
a malícia quando morre
o beijo quando molha
a arte quando fala
silenciosamente ensurdecedora

aos ouvidos faltam pálpebras
desconfortante desespero
sob tantos vãos ruídos
não há som desassossego
há harmonia em calmaria
que transforma a revelia
em sinfonia de silêncios

faísca

um gesto, olhar ou cheiro
uma frase solta ou posta
por mais singela
põe em cheque as (in)certas convicções
gela alma autêntica e inquieta

distorções se injetam
a mais pura clareza se decompõe
não há interpretação que resolva
tudo desmorona

uma faísca vira incêndio
na esponja seca mórbida
será que a água impediria
a labareda que transborda?

conciliar dois ébrios sórdidos
nem se sóbrios estivessem!
a discordância sempre volta
e a revolta mostra a face

daí, tu faísca, vem e fisga
daqui, eu esponja, tomo e fico

sorte… o intento ser o mesmo
e na dança
o fogo
de incêndio
vira vela

e a luz, antes queima
agora ascende
calma e rente
e clareia

o fim em linha reta

ao pensar no ontem desmorono. a frase e o olhar secos e precisos foram sedativos. não quero-te mais. ouvi já indisponível. não sinto-te mais. foi pesadelo aquilo tudo. voltarei pra ele. e você fique só. deixe-me! éramos nós deitados? não sabia. não sei. já soube? não desejo-te. ojeriza-me. quero o chão agora. no ar não dá mais. homem tu não é. falta traço postura tom. me rendo neste ponto. sou o avesso de homem. você não é? qual seu tom postura traço? vem pra cá. veja-se em mim. não papeie, saia fora! vou-me, impreciso. onde vai, tão de pressa? oras, fugir de ti, que refuta-me! não refuto, vejo-me e temo-te.

eu leio kaplan!

escritores podem ser bons
precisam de ao menos um fã
tô preocupado é com a rima
e eu leio kaplan!

la la la la la la coração
êba, posso rimar com chão
mas qualquer pessoa sã
também sabe ler kaplan!

pode ser textinho ou soneto
o importante é que o façam
o cara é fã de monsueto
como não ler kaplan?

sabe nada, sua danada!
zueragem never ends
todos comem rabanada
do kaplan somos best friends

as mina pira nos versinho
élith xinga tudo elas
mas kaplan é moço doido
foge correndo delas

o que importa é os mamilos
calma calma calma, polêmica!
uns poemas são como grilos
foda-se a vida acadêmica
vixe, esqueci de rimar com kaplan…

mar&sol

ao apontar a lua
o mar apavora-se
suas ondas movimentam-se
num azul de transparências
beleza dura na imensidão

o sol no centro emana
luzes: em rajadas
cores: em peles opacas
prismas: em mentes dispersas

mar&sol quando juntam-se
transpassam o belo nome
brilham nos olhos
numa ardil sedução
transforma um cruzar de pernas
em volúpia tentação

trucidando a ideal fidelidade
mar&sol destroça as vísceras
seduz o incauto e, de reluz
foge das teias
e do alto da exuberância
ataca outras vítimas

pobres, homens!
jamais a alcançarão
jamais!

fez-se gênero

posto de pronto onde não pertencia
fez póstumo sua escolha
o nome, imposto, desfez
em vez de definir-se
auto destituiu-se
de posições e perturbações

não tratava-se de trejeito
era íntimo e explícito
no armário não cabia
sem disfarce ou demagogia
muito além do que parecia

a violência fez sua parte
aliou-se: família, vizinhos, o mundo
foi porrada de todos os lados
genitálias sob holofotes
sequelas inevitáveis
dores intermináveis
mas insistiu, porra!

bastada de humilhações
estancou o sangue
empoderando-se

da incerta convicção
estava certa da transformação
o dia em que sua fantasia
deixaria de ser novidade
pura e bela realidade
aceita sem disparidade

você

ata-me,
e desata.

sufoca-me,
e dá ar.

larga-me,
e faz falta.

mata-me,
e revive.

faz pó,
e remolda.

não há palavras
que descrevam,
expressem,
transcendam
ou demonstrem.

indizíveis sensações
experimento.

por você,
com você,
em você,
só você.

invasão

a sua obsessão em ser
plena
independente
individual

machuca
a minha obsessão em ser
junto
complemento
transcendental

difudê

as pessoa tem as manha de me infurecê
sei lá porquê
é assim, o tempo todo
dia e tarde
não espera anoitecê

foi meu lápis a caneta e a tesoura
pra quê me devolvê!?
tocou o fone. um, dois, três
ok, vô atendê
chego lá, parou, que ódio
dá vontade de batê

puta fila, tô com pressa
vem fulano, vem chegando
fura a fila, desgraçado, lazarento, pqp
dô porrada, dô barraco, chamo os hômi
o que fazê?
alguém precisa resolvê
três por quatro, o cara é grande
é melhor eu nem mexê

saio às cinco
que beleza, finalmente coisa boa
desse jeito, chego cedo
só assim pra espairecê
choveu muito, cidade pára
trânsito veio me prendê
ai caraio, assim não dá
o que mais pode acontecê?

chego em casa
som estranho
uns gemido percebi
minha esposa, impossível
como pode? deixa eu vê
chifre ok, me acostumo
ninguém precisa nem sabê
tanto faz primo, truta, amigo
mas com meu pai é difudê

escrevo

não escrevo por mim
escrevo pelos escritos

eles têm vida

me usam
abusam
se lambuzam

mas no fim
são só escritos