não

do meio do termo
da ponderação
a letra pequena
falta de ação
o povo rebelde
sem disposição
a falta de ânimo
da dicotomia
do sim e do não
o som da panela
à um lado só
que bate, se bate
por condenação
se pensa (não pensa)
é reprodução
da fala dos outros
sem a reflexão

vou para a guerra
da educação
mostrar pra galera
que repetição
de tempos outrora
já diz a história
só dá repressão!

não renda, aprenda!
parar pra pensar
é o necessário
olhar ao redor
os interesseiros
desejam apenas
o mesmo de sempre
o poder por poder

se for necessário
irei para frente
e nós em uníssono
faremos ouvir
em grito ardente:
não!

8 de março

acordou cedo e parabenizou as filhas
mas diz haver brincadeiras de menina e brincadeiras de menino

à esposa, deu um lindo vaso de flores
mas lembrou-a: amizade só com mulher, nada de homens

levou chocolate às colegas de trabalho
mas a presidenta: chama de vagabunda

da garçonete beijou a mão, abriu-lhe a porta, um cavalheiro
mas na esquina: gritou “gostosa” à primeira que viu

ligou para a mãe, sagrada, e agradeceu a criação
mas em casa: não lava, não passa e nunca limpou uma privada na vida

de noite, ajoelhou-se, arrependido
pobre homem
sempre ele
só queria passar a mão
com todo o respeito
só que não

juntos

isto é uma foto
impossível
não posso fazer
não posso negar
mas gravei, na mente

dormiu em meu peito
virou-me do avesso

o cigarro acendi
ventilador assoprou
fumaça
em você
percebi-te com frio
desliguei

e vi
teu sono pesado
foi terno

respiras
inspiro

momento eterno
ao te observar
não posso provar
brilhou-me o olhar

ah, e por fim
suei
ventilador religuei
no mínimo
o máximo pra você
o mínimo pra mim

o sono dos justos
juntos
tivemos, temos, teremos

gozo

você
em riste me prosta sob ti
engana meu tato incauto
e some enquanto disfarço

e eu
ainda que de burca estivesse
exalaria pelas brechas o suor
o cheiro de gozo que me desce

transbordo

estou em você
      em trinta segundos
       me perco
transbordo

além

tu sobre meu peito
põe-me sob puro efeito
de algo além

manifestações

incauto, desbravei a cidade
o metrô, contumaz preto trabalhador
hoje é branco (verde e amarelo), golpista
maldito eu.
que não permaneci em casa

ufanismo barato dói
me mata

abu

nos dizia
em pêsames
que morte boa
não havia

fadados estávamos
ao leito (relento)
canos nas narinas
aparelhos de sobrevida
sofrimento

mas ele
o próprio
ao morrer
nos provoca
numa ironia atroz
certeira:

morre dormindo
em paz