você

ata-me,
e desata.

sufoca-me,
e dá ar.

larga-me,
e faz falta.

mata-me,
e revive.

faz pó,
e remolda.

não há palavras
que descrevam,
expressem,
transcendam
ou demonstrem.

indizíveis sensações
experimento.

por você,
com você,
em você,
só você.

Enfim, o fim

Sem firulas e afloramentos, este post vem para anunciar o fim do Negação Lógica. Pode parecer notícia óbvia, devido ao nosso hiato, mas só agora tomamos esta decisão.

Criado em 2009, por três amigos que achavam que faltava um espaço na internet para discutir política de forma descontraída, o Negação Lógica superou as expectativas iniciais. Conhecemos muita gente bacana, discutimos vários assuntos espinhosos sem desrespeito. Acertamos, erramos, tropeçamos e o mais importante, crescemos muito junto com o site.

Apesar de continuarmos achando que falta este espaço na internet, não temos mais condições de continuá-lo com a qualidade que faz-se necessária. E, se para o site permanecer no ar, fosse consequência diminuir o esmero, optaríamos por encerrá-lo. E é exatamente o que fazemos agora.

Esperamos que, dentro das possibilidades, o site tenha cumprido bem o seu papel e que os amigos que conquistamos durante a jornada, não percam-se com o tempo. Sempre será fácil achar-nos por aí. Afinal, a internet é grande, mas instantânea. E com certeza projetos paralelos surgirão.

Aproveito este mini-espaço para agradecer todas pessoas que direta ou indiretamente contribuíram para que o NL durasse o tempo que durou. Todos os colunistas, ouvintes, leitores, críticos, amigos e inimigos. Nos perdoem o clichê, mas sem vocês nada faria sentido. Um agradecimento especial é justo aos queridos Gustavo Guanabara e Marcelo Salgado. Estes dois, enquanto muita gente torcia o nariz, apoiaram-nos e acreditaram que não éramos meros aventureiros. Temos certeza que não os decepcionamos. Quem sabe, quando tivermos condições físicas/temporais/humanas/capitalistas (ops, não resisti) voltemos de alguma outra forma.

634 posts, 2.166 comentários, 95 podcasts e 14 colunistas/colaboradores. Este é o inventário quantificável do Negação Lógica, que a partir deste momento, oficialmente, encerra as suas atividades. Mas o legado intangível é também imensurável. Foi bom enquanto durou e só teremos boas recordações de tudo que nos proporcionou.

Até logo!

invasão

a sua obsessão em ser
plena
independente
individual

machuca
a minha obsessão em ser
junto
complemento
transcendental

Sobre as manifestações em São Paulo

O preço do tomate. A copa das confederações. A visita do Papa Francisco. E todos os outros assuntos que a mídia abraça com amor, carinho e dedicação foram postos de lado na última semana, dando espaço aos comentários mais diversos sobre as manifestações contra o reajuste dos valores do transporte público na cidade de São Paulo (e em algumas outras cidades do Brasil).

A maioria dos brados retumbantes criminalizam as manifestações, junto com as organizações e movimentos que foram, inevitavelmente, vinculados aos protestos. O Movimento Passe Livre e alguns partidos de esquerda (PSTU, PCO e PSOL), apesar de não colocarem-se como “organizadores” dos atos, participam ativamente na mobilização de pessoas pelas redes sociais e com a distribuição de panfletos em filas de ônibus, catracas das estações do metrô e outros locais de grande circulação. Pessoas que utilizam o transporte público, preferencialmente.

Este, inclusive, é um ponto importante durante a análise da cobertura da mídia. A classe média que não faz uso do transporte público também é bem vinda nas manifestações. Afinal, a manifestação ideal será quando não apenas as pessoas diretamente interessadas mobilizarem-se, mas quando houver uma consciência coletiva da necessidade de mudança, independente dos interesses pessoais. Mas como estamos longe do ideal, vemos nas ruas uma minoria, dentro desta maioria que faz uso do transporte público. É uma minoria com mais acesso à educação. Uma minoria que talvez tenha um bom celular (“marginal com iPhone na mão e Nike no pé, badernando por 20 centavos, um absurdo!”, gritam os apresentadores sensacionalistas de TV). Mas uma minoria que USA O TRANSPORTE PÚBLICO.

Não é possível que uma pessoa, em sã consciência, utilize o transporte público na cidade de São Paulo e não considere R$3,20 um absurdo. O ponto principal nem é o aumento de 20 centavos. Isto foi apenas o estopim. R$3,20 é injusto e R$3,00 era injusto. Não espero chegarmos ao “passe livre” (transporte gratuito, pelo menos para estudantes e idosos), mas seria de grande valia se o governo disponibilizasse os dados detalhados do custeio do transporte. Incluso aí, os gastos com manutenção, pagamento de salários, investimentos e lucro das empresas concessionárias. Principalmente, o lucro das empresas concessionárias. É o mínimo.

O que mais irrita alguns críticos é o trânsito causado pelas manifestações. Os jornais, nas rápidas e tendenciosas entrevistas com a população, sempre mostra alguém (dentro do seu carro) reclamando que levou horas para chegar em casa. Que apoia qualquer tipo de manifestação, desde que as mesmas não atrapalhem o direito de “ir e vir”. Como se a luta por melhorias no transporte público não tratasse exatamente do direito de ir e vir.

Se determinado protesto atrapalha o trânsito: ótimo. Porque o objetivo é chamar a atenção. Se a manifestação não interromper o modorrento e repetitivo dia das pessoas, ela será inócua. Ninguém prestará atenção. É tão óbvio que dá vergonha de explicar. É importante informar aos desinformados que a Constituição nos garante o direito de livre manifestação, nas vias públicas, inclusive. Onde os Caras Pintadas chamaram atenção? Alguém acha que o movimento das Diretas Já foi no Parque do Ibirapuera? Que os manifestantes sitiaram a praça Benedito Calixto? Foi em vias públicas, meus caros. Em vias públicas.

Outro argumento interessante, pra não chamar de imbecil, é o de que há hospitais nas regiões dos protestos. Que isso prejudica a locomoção de ambulâncias e, consequentemente, pode custar vidas de doentes que precisam de acesso rápido aos hospitais. Antes de falar sobre isso, invoco o pai dos burros, mais conhecido como Aurélio (ed. 2012), para uma leve definição de falácia:

“2. afirmação falsa ou errônea”

Pois trata-se exatamente disso. Com a falácia espalhada (não apenas pelas redes sociais, mas também por aqueles apresentadores sensacionalistas citados outrora), a natural solidariedade das pessoas aos enfermos e necessitados sobrepõe a lógica e um argumento estapafúrdio como esse vira verdade absoluta na boca dos pseudo-indignados. Talvez seja necessário lembrarmos o óbvio: o que atrapalha as ambulâncias de chegarem aos hospitais não são as manifestações, e sim o trânsito. Trânsito este já comum na cidade. Foi exatamente por isso que algum gênio desconhecido inventou a sirene. Ouso afirmar, inclusive, que os manifestantes abririam espaço mais rápido para uma ambulância do que os carros engarrafados. É uma questão logístico-espacial, acho.

Um último ponto é o já famoso vandalismo das pessoas. Essa gente degenerada e violenta que destrói a cidade, enquanto a gloriosa polícia tenta defender nosso patrimônio. Estes jovens vagabundos querem baderna e destruição, enquanto a polícia defende nosso direito de ir e vir, indo e vindo com balas de borracha e bombas de efeito moral. Essa ratataia periférica que ousa incomodar o centro da cidade, por míseros 20 centavos, ante aos heróicos policiais, defensores da paz e livre convivência.

Não fui a todas as manifestações, apenas algumas. Mas pelo relato de alguns colegas, quem normalmente inicia a violência física é a polícia. Grito e xingamentos são comuns nas manifestações. Muitas vezes esses xingamentos são contra a polícia. Sim, isso é comum. Principalmente quando eles formam a formosa barreira para impedir os manifestantes de avançarem.

O problema é que o ego da corporação policial (principalmente a paulista) vai além da estratosfera. Quando são ofendidos usam da força bruta que detém, legitimada pelo Estado, pra meter porrada em quaisquer cidadãos que estejam pela frente. Não defençável o xingamento aos policiais. Me parece até um desperdício de energia. Mas responder grito com bala está longe de ser eficaz para “evitar a desordem”. Ações geram reações e a polícia militar sabe bem disso. Os governos do estado e prefeitura também sabem.

O que há de interessante nas manifestações de 2013 (diferentes das de 2011) é observar que em vez de diminuírem o número de participantes, aumenta. O segundo ato foi maior que o primeiro. O terceiro, maior que o segundo. O quarto, maior. E o quinto, na próxima segunda-feira, promete.

Talvez não dê em nada. Talvez a passagem do ônibus/metrô suba. Talvez, como sempre, os jornais mantenham o foco na minoria que aproveita do movimento para destruir algumas vidraças, enquanto uma maioria pacífica e escandalosa grita no vácuo da mídia independente e das redes sociais. Mas nós temos câmeras. Tiraremos fotos e faremos vídeos. A polícia não conseguirá destruir tudo. Não temos o que esconder. E se as imagens vierem a público, o próprio público poderá tirar suas conclusões, antes do JN começar.

Enquanto a imprensa e governo fingirem que é uma causa dispersa e ilegítima, ajudará o movimento. Desta vez, é uma causa coletiva e legítima. As pessoas que estão ali acreditam. Não são ingênuas. Sabem que o preço da passagem não reduzirá imediatamente. Mas o diálogo e a reflexão precisavam de um ponta-pé. Nem que seja em troca de balas de borracha e bombas de efeito moral. Vamos gritar e gritar.

E se a tarifa não baixar, a cidade vai parar.

difudê

as pessoa tem as manha de me infurecê
sei lá porquê
é assim, o tempo todo
dia e tarde
não espera anoitecê

foi meu lápis a caneta e a tesoura
pra quê me devolvê!?
tocou o fone. um, dois, três
ok, vô atendê
chego lá, parou, que ódio
dá vontade de batê

puta fila, tô com pressa
vem fulano, vem chegando
fura a fila, desgraçado, lazarento, pqp
dô porrada, dô barraco, chamo os hômi
o que fazê?
alguém precisa resolvê
três por quatro, o cara é grande
é melhor eu nem mexê

saio às cinco
que beleza, finalmente coisa boa
desse jeito, chego cedo
só assim pra espairecê
choveu muito, cidade pára
trânsito veio me prendê
ai caraio, assim não dá
o que mais pode acontecê?

chego em casa
som estranho
uns gemido percebi
minha esposa, impossível
como pode? deixa eu vê
chifre ok, me acostumo
ninguém precisa nem sabê
tanto faz primo, truta, amigo
mas com meu pai é difudê

escrevo

não escrevo por mim
escrevo pelos escritos

eles têm vida

me usam
abusam
se lambuzam

mas no fim
são só escritos

ausência

a cama reclama
a sua ausência

enquanto eu
no canto
aguardo
sua presença

querer querer

o meu querer
querendo querer-te
(ou ter-te)
não quer apenas querer
ele simplesmente é
querendo ou não

achei

te procurei nos dicionários
esbarrei-me em definições
não era você

te procurei em nostradamus
achei resoluções
mas você não era

te procurei no google
encontrei sugestões
era tudo, menos você

te procurei em livros
deparei-me com desejos
desejos distantes de você

te procurei no palheiro
furei-me em agulhas
mas não tinha nada de você

te procurei em outras mulheres
enganei-me reiteradamente
e não era nem de longe você

te procurei em ti mesma
brotaram-me incertezas
agarrei o que pude
mas perdi-me de você

revirei os meus bagulhos
derrubei pincéis canetas cadernos
desviei dos meus caminhos
desisti de papéis metas salários

não ouvi barulho
só silêncio

quando em mim olhei
te achei
perdida em meus cantos
sufocada em minhas expectativas
embrenhada em meus poros
superior a isso isto e aquilo
firme e forte

te agarrei
e não solto!

poesia

perante incestuosos obstáculos desviados
ostento as vísceras em um poema
estendendo aos leitores entoação
sozinha e contida em poucos versos
inconstante e de ramificações adversas
alaúde da dor e da lamentação

é a mais pura dicotomia das ideias

indigestas e vomitadas em excesso
sobre páginas e páginas
sobram restos e lamúrias
obliteradas instantaneamente

complexíssima

num complexo emaranhado
de olhares apurados
seu charme
rebate e bate
provoca e toca
induz e seduz

na luz ou na escuridão
ali está
atenta
empurra e puxa

certezas montadas
ou dúvidas impostas
não importa
são devaneios em suas mãos
captura os fracos
em uma tênue linha
de tentação e perfeição

traz a paz
equívocos
refaz loucuras
a complexidade de seus toques
perfaz a média
e evoca forças
sobre os tais
capturados

por fim
poderosamente decidida
põe os pontos nos ís
e aqueles tais
citados outrora
põe em seus locais
longes dali
daqui
e dela

meto-me

moçoilo
afoito
por desafios
que sou

meto-me
em merdas
mimosamente

são paulo

o passo passa
e passa o passo
a pressa apressa
aperta o passo
corre corre
não demora
que o tempo
apavora
por favor
presta atenção!
no caminho
a sua frente
muita gente
apressada
corre corre
olha o buzão!
estou puto
atrasado
essa gente
atrapalhada
me atrapalha
encalha encalha
sai da frente!
sua velha!

para
respira

não me tromba!
quanta gente
empurra empurra
vai no tranco
sem descanso
a fila anda
corre corre
nunca para
nunca para
nunca para
nunca para!

espetáculo

as cortinas se abrem
a plateia titubeia
as luzes se acendem
ela surge
simplesmente surge

do palco a plateia assusta
da plateia o palco encanta
pulos, gritos, tatos, falas
receios, anseios, devaneios

pulos cuidadosos são manobras
gritos entonados são sussurros
tatos delicados são sentidos
falas encenadas são sinceras

receios são temidos
anseios são atingidos
devaneios são inevitáveis

os olhares incautos
se transformam
de obstáculo
em espetáculo

ela

do nada
esgota-se o inesgotável
renova-se o irrenovável
repete-se o irrepetível
questiona-se o inquestionável
resiste-se ao irresistível

ela disse que era impossível
impossível acontecer de novo
de novo assim de repente
de repente como se não houvesse antes
antes que o velho fosse
fosse embora de uma vez
de uma vez chegou o novo
novo para mim e para ela

ela que tenta ignorar
ignora talvez não percebendo
não perceba que já me entreguei
me entreguei inteiramente
inteiramente envolvido
envolvido em tudo isso
tudo isso é inevitável
inevitável se apaixonar por ela

ela chegou chegando
estraçalhou minhas defesas
derrubou minhas barreiras
recolheu minhas migalhas
juntou os meus pedaços
e devolveu meus ciúmes
medos
defeitos
receios
por ela